A oposição deve cumprir a sua função de fiscalizar e criticar os governos, mas tem de fazê-lo de forma a contribuir para o aprimoramento de democracia, o que implica consistência nas avaliações críticas e apresentação transparente de propostas alternativas. O artigo em referência, redigido num tom inflamado e repleto de expressões tão exageradas quanto vazias (“pequenos assassinatos”, “autoritarismo popular”) e pitorescos neologismos (“subperonismo lulista”), dista muito disso. Sintomaticamente, ele falha em apresentar à nação um debate substantivo sobre os modelos de desenvolvimento que estarão em jogo no próximo pleito eleitoral.
Ao contrário de FHC, o governo Lula está inteiramente preparado para esse debate. Também não temos problema algum em reconhecer méritos de outros governos. Reconhecemos, por exemplo, que os governos do PSDB foram democráticos. Pena que, segundo alguns, a democracia que o ex-presidente tanto defende tenha sido empanada em seu governo com a aprovação, de forma aparentemente pouco louvável, da emenda da reeleição, que deflagrou um continuísmo hoje emulado em nosso entorno regional. À época, FHC ainda tinha popularidade. Será que essa foi uma manifestação precoce do que ele chama de “autoritarismo popular”?
O presidente Lula, que termina seu governo com 80% de aprovação, poderia ter imitado FHC, Chávez e Uribe e proposto, com amplas possibilidades de êxito, um terceiro mandato. Não o fez. Apesar da inegável popularidade, Lula resistiu à tentação fácil do continuísmo. O Brasil representa exceção de amadurecimento democrático, numa região que ainda tem regimes conturbados. Ponto para o Brasil e seus governos recentes.
Também reconhecemos que o governo FHC deu relevantes contribuições à economia brasileira. O Plano Real, iniciado no governo Itamar Franco e consolidado no governo FHC, foi de grande importância para conter o mal da crônica inflação brasileira. Lástima que a vulnerabilidade externa da nossa economia à época fizesse que as seguidas marolas periféricas se transformassem em substanciais tsunamis internos, com conseqüências econômicas e sociais gravíssimas. Não crescíamos e vivíamos pendurados no FMI.
Quando Lula assumiu, diziam que esse quadro de instabilidade se agravaria. Aconteceu justamente o contrário. Graças a um trabalho consistente de redução da vulnerabilidade externa, que resultou na eliminação do fantasma da dívida externa, no controle efetivo e duradouro da inflação, que em 2002 ameaçava sair de controle, e na redução substancial da dívida interna, hoje a nossa economia tem inegável solidez. Somos credores do FMI.
Disseram depois que esses resultados positivos vieram exclusivamente em função da boa conjuntura econômica internacional. Porém, tais resultados continuam na crise. O grande tsunami surgido no centro da economia mundial, o pior desde 1929, virou, no Brasil, uma onda administrável. O País entrou depois está saindo antes da crise. Já retomamos o crescimento e, ao contrário da maioria dos países desenvolvidos, o fizemos sem nos endividarmos com o financiamento de políticas anticíclicas, o que nos dá uma grande vantagem no cenário pós-crise. Méritos para País e seus últimos governos, especialmente para o governo Lula, que manteve a estabilidade monetária, a ela acrescentando o crescimento.
Ademais, o crescimento recente da economia brasileira é inclusivo. Estamos crescendo e repartindo o bolo, até na crise. Graças a programas como o Bolsa Família, bem como à política de recuperação do salário mínimo, iniciada no governo FHC, e à grande geração de empregos formais, cerca de 19 milhões de pessoas deixaram a pobreza. Ponto para o Brasil e o novo ciclo de desenvolvimento centrado na distribuição de renda e no mercado interno consolidado no governo Lula.
No que tange ao pré-sal, devemos assinalar que o modelo de concessões, concebido numa época em que o preço do petróleo era muito baixo e o risco da exploração bastante elevado, foi adequado naquelas circunstâncias. Mas agora, com os preços do óleo em níveis altos e o risco de exploração muito baixo, é necessário implantar o modelo de partilha, que permite o controle estratégico do Estado sobre as novas e gigantescas reservas, e fortalecer o papel da Petrobrás como indutora de desenvolvimento.
A inserção internacional do Brasil mudou da água para o vinho. Com uma política externa competente, diversificamos nossas exportações e apostamos exitosamente na cooperação Sul-Sul e na integração regional, sem descuidar das nossas parcerias tradicionais.Temos, atualmente, protagonismo internacional inédito, o que nos permite contribuir, dentro dos nossos limites, para a contenção de ameaças à ordem internacional, como nos casos da potencial nuclearização do Irã e do golpismo na América Central. Lá fora, até os mais conservadores admitem esses fatos. Louros para o País e a inflexão em nossa política externa gestada no governo Lula.
O nosso país vive inegável ascensão histórica. Combinamos crescimento econômico sustentado com distribuição de renda, plena vigência das instituições democráticas e protagonismo internacional crescente. De “país do futuro”, passamos a “nação do momento”. Ponto para todos os brasileiros, até mesmo para aqueles que, evitando o debate substantivo, refugiam-se num rancor típico dos que têm dificuldades para reconhecer o mérito alheio. O Brasil sabe para onde vai, mas tem gente que já não sabe para onde ir.
*Aloizio Mercadante é senador da República pelo PT-SP.
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